terça-feira, 30 de novembro de 2010

· acho que tou ·

A crônica que eu mais gosto!


– Acho que tou – disse a Vanessa.
— Ai, ai, ai — disse o Cidão.

No entusiasmo do momento, os dois a fim e sem um preservativo à mão, a Vanessa tinha dito "Acho que dá". E agora aquilo. Ela podia estar grávida. Do "Acho que dá" ao "Acho que tou". A história de uma besteira.

Mais do que uma besteira. Se ela estivesse mesmo grávida, uma tragédia.Tudo teria que mudar na vida dos dois. O casamento estava fora de questão, mas não era só isso. A relação dos dois passaria a ser outra. A relação dela com os pais. Os planos de um e de outro. O vestibular dela, nem pensar. O estágio dele no exterior, nem pensar. Ele não iria abandoná-la com o bebê, mas a vida dele teria que dar uma guinada, e ele sempre culparia ela por isto. Ela não saberia como cuidar de um bebê, sua vida também mudaria radicalmente. E se livrarem do bebê também era impensável. Uma tragédia.

– Quando é que você vai saber ao certo?
– Daqui a dois dias.

Durante duas noites, nenhum dos dois dormiu. No terceiro dia ela chegou correndo na casa dele, agitando um papel no ar. Ele estava no seu quarto, adivinhou pela alegria no rosto dela qual era a grande notícia.

— Não tou! Não tou!

Abraçaram-se, aliviados, beijaram-se com ardor, amaram-se na cama do
Cidão, e ela engravidou.


Luis Fernando Veríssimo.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

· cacos abstratos de uma mente ociosa ·

Olhar nos olhos de alguém, e ver a sua imagem, que só pode ser refletida porque os olhos da pessoa estavam brilhando: não tem preço! Sentir seu sorriso em meus lábios: não tem preço! Sabe, eu gosto das suas mãos, e do desenho assimétrico que elas formam, mas prefiro elas envoltas em meus cachos, ou desenhando a silhueta da minha cintura. Mas eu prefiro "que seja eterno enquanto dure" do que "felizes para sempre", porque os contos de fada não são vividos com a mesma intensidade que se vive a vida real, e é essa intensidade que me atrai! Queria voltar o tempo naqueles momentos que a gente curte de olho fechado para não ver o tempo passar. Não, na verdade, sabe o que eu quero? Eu quero novidades que me façam sorrir largo. É, eu preciso disso. Entenda, é difícil lidar com uma pessoa que, ora te dá as mãos, ora te dá as costas... minha atitude neutra vem dessa sua indecisão, é. Mas não vá pensar que sou um anjo, porque não sou pura. Anjos são tachados de idiotas, e como diria a Mulher de Véu, de Nelson Rodrigues, "[...] prefiro mil vezes ser pervertida do que idiota!". Ah, só te peço que não pense besteiras sobre a minha pessoa, por que, apesar dos pesares, sou uma pessoa de bom coração. Eu trabalho a partir da terceira lei de Newton, só que com um pouco mais de intensidade: se você me dá flores, eu te dou um jardim, lindo! Mas, se você me dá dinamites, se prepara, por que eu te dou uma mina inteira, e ainda te dou a certeza de que o amputado da história não vai ser eu. Calma, não se assuste, isso só são coisas que minha mente pensa quando está infestada de ócio. Relaxe. Não é nada pessoal.